Neste domingo, celebramos a Festa da Exaltação da Santa Cruz. Somos convidados/as a nos deter e olhar para Jesus crucificado... o que vemos? Já não é possível descobrir nele "o mais belo dos homens", como exclama o Cântico dos Cânticos. Na cruz, seu corpo perdeu toda a sua beleza. Não mais parece nem mesmo gente. Aparece "golpeado, humilhado, desonrado e triturado" (Is 53,5).
Mas, n'Ele podemos descobrir outra beleza, o amor que Jesus nos tem, que brota do extremo de sua fidelidade e aposta total no Pai e seu Reino. E como sua proposta era contrária aos poderes religiosos e políticos da época, foi condenado injustamente e brutalmente morto. Os cristãos não celebramos ou exaltamos o sofrimento de Jesus, não somos seguidores de um Deus sofredor nem masoquista. Acreditamos na fidelidade do Deus da vida.
Celebramos o amor de Deus manifestado em Jesus que é capaz de abraçar a vida até nas condições mais sofridas, mais rejeitadas para dali oferecer-lhes a esperança de uma vida nova. O evangelho de João, que hoje nos é oferecido, nos dá a orientação para penetrar no mistério desta festa da cruz: "Pois, Deus amou de tal forma o mundo, que entregou o seu Filho único, para que todo o que nele acredita não morra, mas tenha a vida eterna".
A festa da Exaltação da Santa Cruz é a festa do Amor até o extremo, que abre um horizonte de transformação, de possibilidades novas, de liberdade!. E assim como o povo de Israel no deserto olhava para a serpente elevada e era curado, agora "todo aquele que nele (Jesus crucificado) acreditar, nele terá a vida eterna". O centro do diálogo entre Jesus e Nicodemos é o anúncio que Jesus faz a este "judeu importante" de um novo nascimento: "Eu garanto a vocês: se alguém não nasce do alto, não poderá ver o Reino de Deus".
O novo Nacimento que Jesus oferece a Nicodemos é uma nova vida, una vida que brota de Jesus crucificado do qual sai sangue e água (19-34). Não é obra dos seres humanos, é presente de Deus!
Por isso, é preciso que "o Filho do Homem seja levantado", para abrir as portas da vida eterna para a humanidade. Vida eterna que começa nesta terra quando, "olhando" para Jesus, acolhemos seu Espírito que se une ao nosso espírito e nos faz exclamar "Abba! Pai" (Rom 8, 15).
Ao reconhecer-nos filhos e filhas de um mesmo Pai-Mãe, descobrimo-nos irmãos e irmãs de todos os seres humanos e criaturas, parte da grande família de Deus. É isso o Reino!
Nas palavras de Paulo: "De facto, vocês todos são filhos de Deus pela fé em Jesus Cristo, pois todos vocês, que foram baptizados em Cristo, se revestiram de Cristo. Não há mais diferença entre judeu e grego, entre escravo e homem livre, entre homem e mulher, pois todos vocês são um só em Jesus Cristo" (Gal 3, 27-28).
O movimento cristão inicial não se baseava na herança racial e nacional, nem em linhagens de parentesco, mas num novo parentesco em Jesus Cristo. No baptismo, os cristãos entravam numa relação de parentesco com pessoas de origens raciais, culturais e nacionais diferentes, formando uma única família, que quebrava os modelos e estruturas sociais patriarcais e de escravidão.
Em Jesus crucificado, está o germe desta nova humanidade, desta criação nova da qual somos partícipes pelo batismo e pela qual somos responsáveis em viver e colaborar para que ela continue acontecendo nos tempos de hoje.
Olhamos para ao nosso redor e notamos que o novo estilo de relações proposto por Jesus não foi assumido plenamente. O que pauta as relações sociais, nacionais e internacionais é a quantidade de dinheiro que tenho no bolso, no banco ou no exterior.
Isso determina que povos inteiros continuem dizimados por doenças que têm cura, mas a produção desses medicamentos não é rentável economicamente para os laboratórios, como é o caso do Ébola, malarias, enfim, a lista seguiria engrossando…
Celebrar a festa da Exaltação da Santa Cruz é reconhecer e acolher o Amor que brota de Jesus Crucificado, para, movidos por ele, colocarmos nossa vida, profissão, trabalho a serviço da construção de uma família humana, pautada por relações de filiação, de fraternidade, ética e justa.
Dessa maneira, a vida eterna que o Crucificado nos oferece como primícias nesta terra, alcançá-la-emos plenamente, quando cheguemos a nossa Pátria Definitiva.
E, termino, rezando assim:
Oração: Um pobre assim, um Deus assim
Pobre daquele que descobriu a dor do mundo como dor de Deus,
a injustiça dos povos como rejeição de Deus,
a exclusão dos fracos como batalha contra Deus!
Já tem a cruz assegurada!
Feliz o que descobriu no protesto do pobre a ruptura do sepulcro,
na comunidade marginal o porvir de Jesus,
nos últimos que nos acolhem o regaço materno de Deus!
Já começou a ressuscitar!
Pobre do que se encontrou com um pobre assim, com um Deus assim! Feliz dele!
Benjamin Gonzalez Buelta (www..ihu.unisinos.br)